A tradição se alimenta do que Mariana come

Por Bruna Lapa, Caroline Gomes, Geovane Fernandes, Hiago Castro, Janderson Coimbra, Rosana Freitas e Viviane Ferreira


A alimentação é uma dos principais aspectos que definem a cultura de determinado lugar. Por ser uma cidade histórica, Mariana carrega consigo essa marca ainda mais forte, onde a degustação dos alimentos se alia às tradições na construção da identidade cultural marianense. As peculiaridades da comida mineira atraem não só os moradores deste lugar mas também de várias partes do mundo. É comum nos depararmos aqui com turistas que buscam não só conhecer o patrimônio histórico da cidade, mas também suas riquezas culinárias.

Apesar de toda a variedade encontrada na alimentação da região de Mariana, descobrimos que é perfeitamente viável a existência de cardápios alternativos, onde hábitos alimentares se diferem de acordo com o modo de vida de cada um. As personagens desta matéria, Giulle Adriana da Mata e Lourdes Zacarias, ilustraram prescisamente a forma como essas diferenças se manifestam e fazem valer uma velha máxima, que diz que "somos aquilo que comemos". Uma busca alimentação saudável e nutritiva para suas filhas mais novas, a outra contrapõe tal ideia, valendo-se do sabor total dos alimentos sem a preocupação com calorias e nutrientes. 

Entrevista com a socióloga Giulle da Mata. Foto: Bruna Lapa

Os efeitos saudáveis de uma alimentação colorida

A professora Giulle da Mata, 42, da Universidade Federal de Ouro Preto, é adepta à alimentação responsável. Mãe de duas crianças, Giulle faz questão de acompanhar e controlar a alimentação em sua casa, onde a família faz uma descontraída 'competição' em busca de pratos que tenham variação de cores, proporcionadas pelas diferentes tonalidades dos alimentos. Se por um lado, grãos, cereais  e verduras são elementos que não podem faltar, refrigerantes, frituras e doces são totalmente dispensados. Para os temperos, existe também um determinado controle para que não haja exageros e há preferência por ervas e outros condimentos naturais. Quanto à corantes e produtos industrializados, Giulle é enfática: "so quando não tem outro jeito.".

Para a socióloga, a alimentação da população de Mariana é a típica comida mineira, que inclusive, atrai turistas que vem degustar desta, que já é tida como uma espécie de patrimônio imaterial da região. Perguntada sobre a frequência com que opta por se alimentar em restaurantes, ela afirma não ir muito, mas gosta de ir à restaurantes localizados na cidade vizinha, Ouro Preto devido às possibilidades de variação alimentícia que os cardápios destes estabelecimentos proporcionam. Ainda falando de Ouro Preto, Giulle citou a Cooperouro como o principal lugar onde ela compra alimentos, onde, existem maiores opções de compra.

Como anfitriã, Giulle se diz atenta ao tipo de alimentação das visitas que recebe. Se são vegetarianos, saladas, mesas de frios e molhos que ela mesma prepara, são as melhores opções. Para os não-vegetarianos, as alternativas são combinações de carnes com frutas, por exemplo, lombo com abacaxi e lagarto com manga.

Um fato curioso para a professora é a relação intensa do marianense com os alimentos cítricos, que resulta em grande consumo de laranja e limão. 

Feijão Tropeiro preparado por Lourdes Zacarias.
Foto: Janderson Coimbra

Quando a vontade fala mais alto

Enquanto Giulle preocupa-se em manter um padrão saudável de alimentação, em outra região da cidade de Mariana, a funcionária pública Lourdes Zacarias, 54, entrega-se aos prazeres culinários sem maiores restrições.

Deixando de lado a preocupação com os ditos hábitos saudáveise utilizando ingredientes da tradicional cozinha mineira, Lourdes tenta aliar a tradição com a modernidade em seus inventos, cozinhando desde feijão tropeiro à filé à parmegiana.

Lourdes é natural de Mariana e morou na cidade a maior parte da sua vida. Durante o período em que a entrevistamos, foi possível lembrar antigos hábitos e costumes de quando morou na zona rural e as diferenças entre a alimentação na roça e na cidade cozinha como hobby, mas é uma cozinheira de mão cheia. De tradicional família marianense, todos da cidade a conhecem, e muitos são atraídos pelo sabor ímpar de seus quitutes. Várias são as histórias de até onde são conhecidos seus dotes culinários e de quem teve o prazer de prová-los. Sentados no sofá da sala muito bem arejada e sentindo o entorpecente aroma do almoço que ali estava por vir, pudemos conhecer um pouco mais da arte culinária exercida por ela e de sua história, desde seus costumes de quando criança até seu abandono, após a mudança para a cidade.

Lourdes contou que sua alimentação diária é composta basicamente por arroz com feijão, verduras e carnes variadas. No fim de semana não faz nada diferente disso, levando em consideração apenas a vontade do dia. 

Ela considera que a alimentação dos seus conterrâneos é baseada na comida tipicamente mineira, em fogão a lenha. Contando sempre com feijão tropeiro, couve, arroz e o tradicional frango com quiabo, não diferindo muito do restante do estado. 

Suas verduras são adquiridas na feira, que é onde encontra os alimentos mais frescos. Esses alimentos vêm dos produtores rurais da região e, segundo ela, são sempre mais saudáveis, sem agrotóxicos.

É muito raro frequentar restaurantes. Quando vai, consome o que não costuma preparar em casa, uma comida diferenciada, como lasanha e salpicão.

Com bom humor, Lourdes disse que geralmente não prepara nada especial para suas visitas, “são as visitas que se preparam para o meu almoço”. Vários amigos freqüentam a casa, e quando ela está cheia faz basicamente o de costume, aumentando apenas a quantidade. Ela gosta de preparar feijão tropeiro, strogonoff e até tutu de feijão. 

Revivendo seus tempos de criança, ela confessa que sempre se alimentou das mesmas coisas, mas quando mais nova comia o que os pais plantavam. Morava na roça e por isso tudo o que comiam era colhido na plantação de casa. Era tudo muito simples, não possuíam geladeira e por esse motivo era necessário colocar as carnes imersas em conservas de gordura para não se perderem. Matavam vacas, frangos, porcos e até carneiros, e utilizavam sempre esse processo para conserva. Na horta, plantavam de tudo... Era feijão, milho, cenoura, alface e até arroz, que, segundo ela, dava um pouco mais de trabalho. Possuíam também um moinho, secavam o milho e o moíam para fazer fubá. 

Lourdes acha que mesmo utilizando mais gordura, a comida de antes era bem mais saudável. Naquela época não existiam os agrotóxicos, tudo era natural e cultivado em casa por nós mesmos. Questionada do porque do desuso daqueles hábitos, ela justifica que depois de ter mudado para a cidade com o intuito de estudar, ficou difícil manter os mesmos costumes, pois era complicado ir para a roça sempre e não havia possibilidade de mantê-los na zona urbana. E quanto à horta, ela disse que não há como cultivá-las em casa, pois não existe tempo nem espaço.


Palavra de Especialista

A nutricionista Mayra Martins Carvalho, 33, trabalha na rede de saúde pública da cidade de Mariana. No Programa de Saúde da Família (PSF), atende de segunda a quinta feira em uma das salas da Unidade de Saúde do bairro Cabanas. Dessa forma, conhece os hábitos alimentares da cidade.

Simpática e objetiva, Mayra contou um pouco sobre a alimentação, que ela considera tradicional e enraizada na cultura do lugar, tipicamente mineira. De acordo com ela, os marianenses possuem uma alimentação baseada em carboidratos complexos, assim há um consumo excessivo de alimentos como arroz, pão e angu. Na alimentação mais comum e cotidiana, além desses componentes estão presentes verduras (principalmente a couve), o feijão e a carne de porco ou frango. As frutas mais consumidas são a laranja e a banana.

Como qualquer cidade hoje em dia, Mariana não está livre do demasiado consumo de refrigerantes e frituras. Segundo a nutricionista, quem mais procura seus atendimentos são adultos que possuem problemas renais ou doenças como diabetes, hipertensão e hipercolesterolemia. Já as crianças que precisam de tratamento se dividem entre as obesas e as com risco nutricional. 

Sobre as tão temidas obesidade e desnutrição, ela afirmou não saber o número exato de casos de cada uma dessas doenças, mas pelo que presencia em seu trabalho cotidiano, a obesidade é mais frequente pois está intimamente relacionada aos hábitos alimentares. 


Grupo 1. Edição de texto: Caroline Gomes, Hiago Castro, Janderson Coimbra e Viviane Ferreira. Foto: Bruna Lapa. Making off: Geovane Fernandes e Rosana Freitas.

Confira o making off da matéria.

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