Alimentação estudantil


Por Ana Rafaela, Flávio Ernani, Júlia Cunha, Kaio Barreto, Tamires Duarte e Thiago Huszar


Parece difícil imaginar um almoço em família aos domingos, quando você é um estudante universitário que mora longe dos pais e irmãos. Seria, se não fosse a união dos estudantes que moram em repúblicas na Rua Jacarandá, na cidade de Mariana-MG. É no bairro Rosário que toda essa movimentação “familiar” acontece.
Marcamos de nos encontrar com as moradoras da República Aroeira para tecer o que gira em torno de um almoço republicano, quando este não ocorre no Restaurante Universitário da faculdade. Depois de uma caminhada um tanto quanto íngreme, subindo o morro que dá acesso à rua, chegamos ao nosso destino.

Quem nos recebe é a Rafaela Barros – diga-se de passagem, com um sorriso amplo que é percebido por toda a equipe. Rafa, como é conhecida pelos amigos, cursa Serviço Social na Universidade Federal de Ouro Preto e mora com mais dois na república (Igor Giacomassi e Walquíria Rezende, graduandos em História).
Rafaela grita do segundo andar “Kaio, pega a chave com a Júlia”. Julia, mora na república da frente e é amiga desde que moravam juntas em Ouro Preto. Após tomar posse das chaves, tivemos acesso ao predio, onde no primeiro andar  se localiza a República Aroeira e no segundo, a Calangos.

O sorriso não é somente da Rafaela. Walquíria, a colega de república, também nos recebe com a mesma cumplicidade. Na casa de seis cômodos estavam Walquíria, Rafaela e João Pedro Menezes, morador da Calangos. O almoço já estava quase pronto: macarronada ao forno. Segundo as moradoras “estudante come macarrão e Miojo”.

Enquanto o macarrão gratina no forno, as meninas ligam para os demais moradores da Calangos e da Vemkvem (República da Júlia). Cerca de vinte minutos depois chegam todos. A refeição é para muitos, são quatro repúblicas totalizando onze estudantes – e a nossa equipe foi convidada para sentar à mesa junto deles. Em cada fim de semana o almoço é servido em uma república diferente.

Não há cerimônia, todos são de casa assim que entram pela porta da frente. Com clima descontraído ouve-se um “obrigado garçom”, vindo de João Pedro quando alguém coloca os refrigerantes na mesa. Família aqui é somente uma questão de nomenclatura. Como nos disse, o   estudante de jornalismo Arthur Medrado “bastam três meses de convivência para se ter irmãos em todas as partes e repúblicas da cidade”. Lógico, que os ditos irmãos são os mais chegados da roda, uns seis ou sete.
Nosso interesse não é no almoço em si, mas em perceber o que move jovens sozinhos a reunirem-se à tarde. Sim, essa confraternização ocorre na parte da tarde porque geralmente todo sábado é dia de Rock – como chamadas as festas republicanas aqui – e ninguém consegue acordar cedo no domingo. Na verdade, acordam antes do mercadinho da rua fechar, às 13h.

Nos chama atenção também a nota de compras presa à geladeira: “dois reais cada”, o quanto vai custar o almoço  para cada um dos convidados. Por coincidência, o almoço que registramos custou o mesmo que uma refeição do restaurante universitário.
A convivência nos faz perceber que o tal laço sanguíneo que definiria uma família não se faz necessário aqui. Mesmo sentindo saudades de casa, eles encontram nos amigos-família uma válvula de escape para os anseios de morar longe. Tamanha a influência desses dois tipos de família que quando a saudade aperta, um chora suas lamúrias ao outro.
Foi assim que nos disseram que aconteceu certo dia, quando Alexander Alves (também morador da Calangos) bateu à porta da Aroeira, movido pela ânsia e inquietação da saudade da mãe; Alex ficou envergonhado quando a amiga Walquíria nos confessou tal fato.
   
Notamos outra característica dos estudantes, eles gostam muito de receber visitas e mais ainda de conversar. Walquíria confessa: “Eu odeio pessoas bovinas, aquelas que só falam ‘hum’, sabe?”, comenta olhando fixamente para o colega Iuri Nunes, outro morador da Calangos, que nos recepcionou junto com as meninas. E ainda completa: “vamos, fala Iuri”, mas é vencida pela vermelhidão que provoca no rosto dele. Toda essa gama de causos – como dizem os mineiros – nos é relatada entre o pré e pós almoço.

Os móveis geralmente são poucos em repúblicas. Nessa reunião, por exemplo, unimos duas mesas sendo uma delas, da República Vemkvem. O esforço em ficar juntos para parecer uma coisa regrada é perceptível, ouve-se vez ou outra um “gente, vem todo mundo aqui pra dentro” mesmo que alguns tenham que ficar de pé, para a conversa após o almoço.

Entre muitos risos patrocinados pela turma, Walquíria lembra que estamos observando e solta “agora vamos entrevistar vocês/põe aí que eu sou cristã” numa brincadeira de intimidar nossas considerações (as quais escrevo agora) e de garantir os adjetivos de pessoa gentil e séria, como se isso fosse necessário.




É hora de dar tchau
Já terminamos o almoço há certo tempo. Percebemos agora a ausência de Rafaela, que se justifica, não por estar desconfortável com as pessoas em sua casa, mas por estar no quintal  fazendo sala para os amigos fumantes. Walquíria até diz que não aguenta ter que seguir a Rafa quando estão conversando e ela diz que precisa fumar na parte externa do apartamento.

Resolvemos nos despedir dos amigos das repúblicas. Como todos se levantam e vão para a cozinha, acabamos por segui-los; daí surge uma nova reunião. Notamos que algumas louças já haviam sido lavadas, pois é esse mais um acordo feito entre esta “família”. Alguns cozinham outros lavam.
Chegamos 12h30 e estamos saindo ás 16h30. Na despedida o sentimento de família e descontração ainda impera, principalmente quando Walquíria e Rafa dizem quase em coro “não é só porque vieram fazer a matéria que não podem voltar não”. 

De fato, já envoltos na aura desse ambiente republicano, só Deus sabe quanto tempo ficaríamos ali, observando e conversando nas dependências do prédio amarelo na Rua Jacarandá.









O "bandeijão" de cada dia


São seis da manhã, e enquanto muitos alunos estão dormindo, os funcionários encarregados de preparar o almoço para os Restaurantes Universitários (RUs) da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP) chegam ao campus principal. Luvas, aventais, óculos de segurança, botas, toucas, tudo para atender as normas da vigilância sanitária.
 São cerca de 90 funcionários que trabalham na cozinha, divididos em dois turnos para que o almoço e o jantar fiquem prontos a tempo. Depois de tudo preparado, às dez horas da manhã o caminhão baú transporta a comida do campus de Ouro Preto para os RUs de Mariana em recipientes gastronômicos, colocadas em caixas recipientes vedadas – para não perderem a temperatura e evitar que a comida estrague ou se contamine.
    A responsável administrativa pelos cardápios é Judite Gomes de Oliveira, e ela nos conta como funciona o processo de escolha: “Nós trabalhamos de acordo com a aceitação e número de usuários, os tipos de equipamentos disponíveis e número de funcionários. Tudo isso é verificado antes de se elaborar um cardápio. Como o número de refeições é muito grande – apenas no campus de Ouro Preto são servidas  aproximadamente 1.700 refeições somente no almoço, e para os restaurantes de Mariana são fornecidas 750 refeições – os cardápios se atêm ao básico”. Por mês, no conjunto de restaurantes da UFOP são seis toneladas de arroz, cinco toneladas de feijão, 3.500 quilos de alface, e se fosse servido durante o mês apenas carne de frango, seriam mais de 22 mil quilos.
  
Se pegarmos como parâmetro a carne de boi, servida todos os dias para os estudantes de Mariana, seria necessário um boi por dia para alimentar a todos, isso se considerarmos um boi que pesa cerca de 230 quilos. Mas, como a carne bovina é servida em média três vezes por semana, então são abatidos pelos menos doze animais para alimentar o batalhão de estudantes. 
O desperdício também existe. Judite Gomes calcula aproximadamente 30 gramas por pessoa ao dia de comida que não pode ser reaproveitada. No restaurante do campus de Ouro Preto, a comida é reciclada. A “sobra limpa” – aquela que fica dentro da cozinha – é utilizada no jantar. O que não acontece em Mariana; por serem refeições transportadas, é sempre enviada uma nova leva de alimentos.


Por meio de licitações, são fechados contratos de um ano com empresas que tenham o menor preço para fornecer os produtos necessários para o preparo da comida. A quantidade de nutrientes e calorias é calculada baseada na altura média de um jovem, seja homem ou mulher, pelo peso médio de um estudante, sendo que a atividade é considerada moderada. Da generalização nasce o número de calorias necessárias para o estudante da UFOP – em torno de 2.500, divididas em almoço e jantar.

No turno que começa uma da tarde, a encarregada de cozinha Ângela Maria de Souza, nos recebe com muita simpatia e um largo sorriso no rosto.

A senhora, que mora com os dois filhos e dois netos, já almoçou em casa. Ela nos conta que almoça em casa e janta no RU, “em casa, não gosto de repetir a comida que fiz no dia anterior, no trabalho. Nem posso! O dinheiro não dá para comprar tudo o que é servido aqui” – justificando a variedade existente no cardápio. O “toque especial” deve-se ao carinho e cuidado com que são preparadas as refeições. Para Ângela, o mesmo apreço  com o qual se faz um quilo de comida, também se faz trezentos. Nem sempre o tempero agrada a todo mundo, mas ela diz adorar receber elogios dos alunos.

Confira a enquete realizada com 90 alunos do Instituto de Ciencias Sociais Aplicadas (ICSA) e Instituto de Ciencias Humanas e Sociais (ICHS), sobre a frequencia de utilização dos Restaurantes Universitários da Universidade Federal de Ouro Preto  no almoço, jantar e nos finais de semana

Grupo 4. Edição: Ana Rafaela, Flávio Ernani, Júlia Cunha, Kaio Barreto, Tamires Duarte e Thiago Huszar. Fotos: Flávio Ernani, Júlia Cunha e Kaio Barreto.

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